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quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Meu melhor amigo.

Era um dia qualquer em uma semana qualquer. Acabara de chover e o céu ainda estava nublado, chão úmido que fazia ficar aquela noite um pouco mais fria. Nada de diferente nesse dia, nenhum evento importante nem algo parecido que fizesse Fred ver aquele dia de maneira que não fosse como um dia qualquer.
O trajeto feito por ele sempre era o mesmo. Pegava a rodovia, dirigia até o quilômetro dezessete , virava em uma rua secundária, andava mais cinco quilômetros até passar por uma pequena ponte e novamente virava em uma rua secundária para chegar em casa. Só que desta vez ele não queria concluir o trajeto. Ele resolveu parar na ponte no acostamento e ir olhar o rio que passava à 10 metros abaixo dele. Eram quase duas horas da manhã. Não dava para ver muita coisa.
Depois de alguns minutos ele percebeu que estava ao lado de uma escada que era soldada na viga de sustentação do lado da ponte onde ele estava. Ele simplesmente não pensou e começou a subir para ver como era a vista lá de cima. Ele não pensou muito, mas acreditava que querer ver como era lá de cima era apenas um dos motivos para subir.
Ao chegar em mais da metade do caminho ele escuta algo caindo na água. Não parecia ser grande. Ele olha para cima se debruçando para o lado da escada e vê algo se mexendo. Curioso, continua subindo as escadas para descobrir do que se tratava.
No topo, ele olha e vê um homem que está sem um dos sapatos em pé numa viga horizontal escorado na viga vertical que está ao lado da viga onde Fred se encontra. Fred simplesmente sobe nesta mesma viga horizontal, se distancia do homem, senta-se na viga e acende um cigarro. Não diz nada, mas o homem percebe que Fred está logo ao seu lado.
Passam-se alguns minutos e o homem diz:
- Quem é você?
Fred que já estava acabando o seu cigarro o joga lá embaixo, solta a fumaça e diz:
- Eu sou o Fred. Quem é você?
O homem faz uma cara de quem não entendeu o que se passou e diz com uma voz um pouco exaltada:
- Eu sou o Jonas. O que você quer aqui?
Fred se levanta, se escota em uma pilastra e olha para a linha do horizonte criada pela copa das árvores e diz com uma expressão calma:
- O mesmo que você, Jonas.
Jonas ainda com uma expressão de desentendimento fala:
- Você não parece querer se suicidar. Você tem cara de quem veio me tirar daqui! Se você chegar perto de mim eu vou pular.
Fred olha para ele com um olhar sereno e diz:
- Rapaz, eu não sou policial. Nem me pareço com um. Não me pareço com super-herói também. Eu tenho os meus problemas e eu gostaria de resolvê-los. Salvar você não mudaria nada na minha vida. Faça o que você bem entender.
Jonas faz uma expressão de descrença junta com um suspiro e diz:
- Você chega aqui, se senta neste lugar extremamente alto como se estivesse sentando em um banco de praça, fuma um cigarro e agora está calmo dizendo coisas de alguém que só tem problemas. Você não parece nada. Muito menos um suicida.
Fred continua olhando para frente e diz com calma:
- Já que você é quem parece suicida aqui, me diz o motivo de você querer se matar.
Jonas para de fazer o olhar de desentendimento, volta-se também para frente, segurasse com mais firmeza na viga e diz:
- Eu tenho trinta e sete anos. Minha mãe faleceu no começo do mês e eu fiquei devastado. Minha mulher semana passada veio me contar que o bebê que ela carrega por sete meses não é meu e sim do meu suposto melhor amigo. Para piorar, ela me contou isso quando eu fui dizer que seriam tempos difíceis, pois eu havia sido despedido da empresa onde trabalhava por quatorze anos por dizer para o meu chefe que o projeto em que ele queria investir era provavelmente a pior coisa que ele podia fazer. Ele tomou isso como afronta e me despediu. Por isso estou aqui.
Fred acende um outro cigarro e não diz nada. Expressa que está pensativo, mas não comenta nada. Somente aproveita o seu cigarro. Olha para Jonas com um olhar tranquilo e jonas volta com a expressão de desentendimento e diz:
- E você, senhor "não sou suicida", qual a sua história para estar aqui já que você não diz nada.
Fred volta a olhar para frente, tira o cigarro da boca e o segura entre os dedos e diz:
- Eu estou beirando os sessenta anos de idade. Sou viúvo e minha filha se casou e foi morar com um rapaz que ela conheceu em uma viagem que fez à Europa a cerca de três anos atrás. Eu me sinto sozinho e gostaria de encontrar com a minha esposa novamente.
Jonas ri e diz:
- Você só pode estar brincando. Você não tem uma vida ruim e quer acabar com ela? Qual o seu problema?
Fred responde:
- A sua vida não é ruim e você quer acabar com ela e eu que tenho problemas?
Jonas para de sorrir, franze o rosto e diz:
- A minha vida é bem ruim até onde eu me lembro e...
Fred o interrompe falando:
- E você é novo e pode refazer tudo de novo. Eu já amei, já vivi meu sonho de ter uma empresa bem sucedida, não tenho mais amigos vivos pois todos eram bem mais velhos que eu já se foram e a unica pessoa com quem eu me importo está feliz longe de mim.
Jonas sente o peso de tristeza nas palavras de Fred e diz:
- Eu não acho que você deveria pular. Acho que você deveria terminar de viver essa vida boa e ter paz no fim.
Fred olha para ele enquanto põe o cigarro quase acabado de volta na boca e diz:
- Eu acho que você não devia se matar, pois você aprendeu que a sua mulher não te amava o suficiente e preferiu outro, o que faz você estar melhor sem ela, e que você dá importância ao que é certo independente de quem você vai ter que afrontar. Arrume outra mulher e outro emprego. Você não amava nenhum dos dois a ponto de morrer por isso, sejamos francos.
Jonas olha para Fred com um olhar de quem teve uma epifania, não diz nada, seus olhos começam a lacrimejar e ele se aproxima da escada. Ele começa a descer. Fred acaba seu cigarro e começa a descer logo em seguida. Quando os dois chegam ao chão Fred olha para jonas e diz:
- Que bom que você resolveu lutar, rapaz. Fico feliz por você.
Jonas sorri e diz brincando:
- E você, vovô, por que não pulou?
Fred vira-se e começa a andar para o seu carro procurando as chaves em seu bolso e diz:
- Porque eu precisava de um amigo que me fizesse sentir que eu fazia diferença para algo e eu já o encontrei.
Jonas fica lisonjeado e sem palavras enquanto Fred começa a abrir a porta do seu carro, ele entra no carro e começa a vir em sua direção fora do acostamento até parar do lado dele. Jonas se debruça na janela e Fred diz:
- Quer uma carona, meu amigo?
Jonas sorri e entra no carro que agora reflete a luz do sol de um amanhecer em um dia com poucas nuvens no céu e apenas um sapato e dois cigarros boiando em um rio.

segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Amigo para um. Nada para outro.

Um rapaz se aproxima de onde está um amigo antigo e começa a falar:
- Já faz algum tempo que não nos falamos, amigo. Acredito que já tenha se passado alguns anos desde a ultima vez que nos vimos. Desculpe por estar ausente. Eu tive que resolver algumas coisas para poder vir te ver.
Acho que você nem deve se lembrar do passado e do tempo que as coisas eram mais simples. Eu não sei se você fez questão de guardar os momentos legais que a gente teve. Nós eramos bons amigos. Talvez os melhores. Uma pena ter que acabar como acabou.
Ah, antes que eu me esqueça... Me desculpe pelas brigas e pelos problemas. Não sei se é recíproca essa preocupação, mas eu já desculpei você pelas coisas que você fez. Eu não sabia bem se você se importava com as coisas que você fazia, uma vez que você era assim com todo mundo. Ninguém parecia importar para você. Era estranho tudo e todos parecerem descartáveis para você. Só que todo mundo acabou percebendo com o tempo.
Espero que você não esteja sozinho onde você está agora. Tomara que finalmente você tenha mudado e consiga agora valorizar quem quer o seu bem. Por uma vez eu gostaria de ver você fazendo questão de ter alguém na sua vida que você visse como necessário mesmo não sendo de fato.
O rapaz leva a mão ao rosto, fecha os olhos, esfrega os olhos franzindo o rosto. Ele demora alguns segundos, se recompõe e diz:
- O que aconteceu, meu amigo? Por que tudo de repente se transformou em um eterno desperdício de tempo e desleixo? Qual foi o problema todo? Eu realmente não entendo.
E você vai ficar aí quieto como sempre. Não vai dizer nada. Eu não culpo você por isso. Acho que não tem mais nada pra ser dito. Só existem agora perguntas que não vão mais ser respondidas. Não faz muita diferença elas serem ou não também. O que acabou acabou.
Eu não devo aparecer mais. Já fazem alguns anos que eu me dei conta que a nossa amizade acabou. Eu só vim aqui mesmo me despedir. O caso é que eu me importo com poucas coisas na vida tanto quanto me importo com a amizade e mesmo que você não me considere seu amigo, um dia eu considerei você meu. O que eu mostro aqui é um sinal de respeito por alguém que me ensinou a ser melhor. Pode parecer piegas para você e você provavelmente iria me ofender como sempre me chamando de algo. É engraçado, porque você projetava em mim tudo que você acreditava ser você mesmo.
Adeus, meu amigo... Bom, adeus.
O rapaz se vira e começa a andar. Ele deixa flores para o ex-amigo. Ele sai do cemitério sem olhar para trás ou chorar uma unica lágrima. Ele se despediu. Demorou, mas o fez em fim.

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Asas, auréola e uma conversa.

- O que você faz aqui em cima deste prédio, meu amigo?
- Estou observando algumas pessoas que gosto.
-Mas com esse olhar inconformado? O que aconteceu?
- Eu estou um pouco decepcionado com eles. Eles são boas pessoas, mas andam fazendo escolhas que eu não compreendo e nem aprovo.
- Entendi. Você se preocupa muito com eles, não é?
- O suficiente para estar aqui com esse olhar e tentando pensar em uma maneira de ajudá-los.
- Me conta... O que eles fizeram para te deixar assim?
- Está vendo aquele homem no prédio verde no terceiro andar? Aquele que é calvo e está vestindo uma camisa branca.
- Sim, vejo.
- Ele morava no bairro nobre da cidade, era um homem ambicioso e batalhador. Um belo dia se apaixonou por uma mulher que não fazia nada além de deixá-lo sem querer crescer, pois ela tinha uma visão de vida estagnada. Então ela não tinha pretensão de melhorar de vida e isso fez com que ele desistisse da dele e vivesse uma vida medíocre com ela.
- Espera. Se ele é feliz, ele fez o certo.
- Como uma pessoa é feliz depois de perder a fé no que ele sentia, ter uma vida que odeia e tentar se suicidar três vezes? Ele só está ali naquele cômodo daquele apartamento, pois eu o salvei duas vezes. O chefe quase me despediu por isso, mas eu não pude deixá-lo se matar. Ele ainda pode ser grande como foi um dia. Mas eu não sei se ele vai conseguir, pois o chefe não deixa mais eu ver o futuro dele.
- Bom, eu não sabia disso. É só ele por que você zela e se preocupa?
- Não. Está vendo aquela mulher loira naquele prédio espelhado no sétimo andar arrumando o cabelo?
- Sim, vejo.
- Ela está hoje com 23 anos, mora sozinha, é independente e tem um bom emprego. Só que ela fez uma promessa para ela mesma que nunca faria sexo sem amor. Por algumas vezes ela se descuidou com bebidas e fez. Ficou arrasada com ela mesma e tentou se policiar, mas um belo dia ela resolveu mudar e nunca mais lembrou da promessa que ela tinha feito que que dizia ser tão importante.
- Mas ela está bem.
- Você não reparou nos números em cima da cabeça dela? Faltam somente 4 dias para ela começar a morrer.
- Eu vi. Pessoas morrem. É algo que faz parte da vida.
- Ela vai começar a morrer, pois vai sair com os amigos, beber demais e dormir com um rapaz que vai encontrar com ela na festa em que ela estará. Esse rapaz tem AIDS e não vai contar para ela. O preservativo vai estourar em algum momento e ela vai contrair a doença.
- Nesse caso é algo a se pensar. Uma intervenção seria boa, mas eu não acho prudente depois do chefe já ter te chamado a atenção.
- Fico com pena, pois ela é uma boa pessoa que apenas nunca teve quem a instruísse a amar. Ela aprendeu sozinha da maneira dela. Uma pena.
- Olhe pelo lado bom. São só duas pessoas com problemas, existem muitas outras que te trarão alegrias.
- A questão não é quantidade. O que me deixou da maneira que estou é o fato das coisas terem tomado um rumo que essas pessoas não iriam querer se tivessem pensado melhor. E que agora estão destinadas a seguir por esses caminhos e se arrepender até terem força para mudar. Isso se elas conseguirem mudar.
- Como eu disse... Olhe pelo lado bom, são somente duas pessoas.
- Na verdade existe mais uma pessoa. Aquele homem ali naquele prédio humilde no fim do quarteirão. Quarto andar. Aquele ano fumando debruçado na janela.
- O que tem ele?
- Ele nunca teve uma uma vida fácil, foi sempre derrubado. Ele foi criado pela mãe e as irmãs mais velhas, pois o pai o abandonou. Teve que cuidar do enterro da mãe sendo jovem por ser o homem da casa. E agora tem esse pequeno apartamento que está hipotecado, pois ele perdeu o emprego.
- Mas nem todo mundo nasce com sorte na vida. Ele por acaso foi uma delas. Uma pena, mas acontece.
- A questão não é essa. Ele teve forças para não ter nenhum vício até os trinta e um anos de idade. Depois de poucos dias tendo hipotecado a casa, resolveu fumar um cigarro e depois do primeiro ele não parou. Agora ele fuma dois maços por dia e daqui há um mês ele sentirá os efeitos do câncer que ele tem no pulmão esquerdo.
- Só que essa foi a escolha dele. Não podemos fazer nada.
- A questão é que antes da mãe dele morrer, ele prometeu a ela que nunca teria um vício, pois ela contou a ele que a família era desestruturada por conta dos mesmos. O pai era alcoólatra e saiu de casa e nunca mais voltou, pois batia nas filhas e na esposa e o também contou que o tio havia morrido de câncer por fumar três charutos por dia.
- E mesmo assim ele achou que não seria o caso dele?
- Eu acredito que ele nem pensou a respeito. Essa foi a maneira dele de esquecer por um breve momento o quanto a vida foi injusta com ele. Mas ele não devia culpar a vida, ele que não tentou se levantar em momento nenhum. Agora só resta um mês de vida para ele.
- Bom, agora eu também quero me sentar, me dê um pouco de espaço.
- Vai sentar por quê?
- Porque agora eu entendi o que você está passando e fiquei como você está.
- Entendi. "Em que ponto chegamos", não é? Esse é o pensamento que está na sua cabeça, como na minha...
- Não. "Em que ponto eles chegaram". Foi nisso que eu pensei.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Uma amizade com raízes.

Esta é uma história simples e comum. Uma história em que tudo podia dar certo, mas seria fácil demais... assim, houveram problemas, houveram lágrimas e sorrisos e finalmente houve algo. É algo sobre dois amigos. Amigos de verdade e sobre o tempo. Nada além e nada menos que isso.
Como em toda história, começamos falando dos dois personagens. Um deles se chama Flávio e o outro Roberto. Flávio é o rapaz responsável e trabalhador que nunca perde a esperança nas pessoas e sempre procura o que a pessoa tem de melhor dentro dela. Apesar de nem sempre conseguir, ele tenta ser a melhor pessoa que ele pode ser. Ele sempre se viu dependente de Roberto por ser carente de momentos felizes por se abalar muito com as poucas tristezas que viveu. Roberto tem uma visão de vida menos otimista e é mais racional beirando a frieza, porém em alguns momentos vagos dá para ver que há um coração batendo no peito dele. Ele sempre tentou passar a ideia de que não precisava de ninguém, mas todos que o conheceram sabiam que era mentira.
Passou muito tempo e esses dois cresceram juntos. Eles não tinham a mesma idade, mas tinham uma visão sobre o amor muito parecida. Os papos sobre as mulheres duravam horas e horas, eles inventavam teorias e tentavam deduzir tudo que fosse possível sobre esses seres tão pouco compreendidos pelos homens. Assim começou uma amizade sadia. Falando besteira tendo uma visão parecida sobre algo que eles inegavelmente adoravam. Mulheres.
No começo a falta de maturidade de ambos não os fez ser nada além de espectadores e especuladores, mas com o tempo eles aprenderam um truque ou outro. Não só com as mulheres, mas também sobre a vida. Hoje Flávio tem 25 e Roberto tem 27 e eles sabem muita coisa sobre muitas coisas. Será que isso é tudo?
Por muito tempo eles não se viram. Eles brigaram por não suportar certas diferenças e ficaram algum tempo sem se falar. Por alguns momentos passavam brevemente pensamentos na cabeça de cada um sobre o que havia acontecido. Eles se peguntavam qual havia sido o motivo da briga e não havia resposta. Havia saudade dos momentos de teorias infantis e gargalhadas exageradas.
Um dia os dois esbarraram um no outro em um bar que eles costumavam frequentar. Flávio estendeu a mão e disse para Roberto:
- Opa, tudo bem?
Roberto olhou para ele com um uma reação de desentendimento e sem apertar a mão dele disse:
- Da licença, amigo... Quero passar.
Flavio ficou com uma cara de desapontamento, abaixou a mão e deu passagem e Roberto foi embora. Logo depois enquanto Flávio está andando até seu carro e acendendo o cigarro que havia ido comprar no bar, vê Roberto esperando por ele encostado no seu carro. Flávio diz:
- Algum problema... amigo?
Roberto não revida a ironia e diz:
- Por que você teve que fazer aquelas coisas, cara? O que eu fiz pra você? Eramos melhores amigos.
Flávio esboça uma reação de desentendimento e diz:
- Do que você tá falando, Roberto? Eu não fiz nada.
Roberto balança a cabeça olhando para o chão com uma expressão mostrando que não crê no que ouviu e diz:
- Você começou a beber demais, bateu o carro na minha casa e depois disso sumiu e agora diz que não fez nada? Por que você não se desculpa? É o mínimo que você poderia fazer.
Flávio fica cabisbaixo e diz:
- Eu não pude falar ou fazer nada. Eu bebi demais, roubei o carro da minha mãe e bati na casa do meu melhor amigo por estar embriagado demais. Eu só consegui fingir que nada havia acontecido.
Roberto não diz nada. Ele olha para Flávio com uma expressão de raiva, mas ao mesmo tempo ele entendia como o amigo se sentia envergonhado. Então antes de Roberto falar algo, Flávio diz:
- Faz o que você tem que fazer, Roberto... Eu mereço.
Roberto esmurra o rosto de Flávio com muita força. Flávio é jogado contra a porta de seu carro que amassa e cai no chão. No seu rosto logo abaixo do olho direito há um corte e ele está zonzo. Quando ele olha para Roberto, vê que ele está estendendo a mão para ajudá-lo a levantar. Quando Flávio se levanta, Roberto diz:
- A gente se divertiu muito, a gente viveu muita coisa e aprendeu muita coisa. Eu te amo como um irmão. Você fez falta. Vamos conversar e rir... sinto saudade disso.
Flávio sorri e eles entram no bar, sentam em uma mesa enquanto Roberto bebe uma cerveja e Flávio toma um refrigerante e fuma um cigarro.
Uma história comum e que pode ser contada por muita gente que viveu algo parecido. Mas talvez o que essas pessoas não tenham vivido foi viver uma vida com um amigo de verdade. Um que se desculpa da maneira que for e outro que aceita as desculpas da maneira que for.

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Justiça psicopata.

Era uma tarde de terça feira e eu chegava em casa novamente exausto. Não conseguia fazer com que aquela dor de cabeça me deixasse em paz e nem que minhas mãos parassem de latejar após o contínuo uso delas naquele teclado horrível do escritório. Tentei tomar dois analgésicos e até soníferos e nenhum deles conseguiu fazer com que eu encontrasse alguma paz.
Me vejo deitado na cama olhando para o teto por cerca de três horas e daqui a duas horas tenho que voltar para o trabalho. Aquele lugar fétido cheio de pessoas falsas e que somente estão ali para sugar toda a capacidade pensante das pessoas em cargos abaixo dos deles e usar para benefício próprio. Aproveitadores malditos que me enojam.
Passaram 2 horas e meu expediente nem está pela metade. Não acredito que eu consegui resistir esse tempo todo com essa dor de cabeça e essas mãos trêmulas apenas com um copo de café e um analgésico. Não sei se as seis horas que me restam vão passar com tanta facilidade como essas ultimas duas. Espero que sim.
Até que a hora do fim do expediente chegue, pretendo ir muitas vezes ao banheiro para poder espairecer já que aquele gordo que eu chamo de chefe fica passando no corredor de quinze em quinze minutos para ficar observando se todos estão trabalhando como os escravos que ele tanto queria ter. Como eu odeio aquele idiota.
Já passam das nove da noite e era para eu ter saído daqui tem três horas, mas novamente a desgraçada da minha supervisora veio com aquele tom de voz de quem está querendo me chantagear e falou que "gostaria" que eu ficasse fazendo hora extra para compensar as faltas da semana no meu setor. Vadia. Deve estar fazendo sexo novamente com aquele cara do quinto andar. Boçal que não sabe que essa vagabunda tem aids. Bom, essa foi a unica vez nesse dia em que eu esbocei um leve sorriso.
Cheguei em casa novamente e lá estava eu... deitado na cama entorpecido de remédios que me fariam dormir, mas me mantém acordado num estado vegetativo e estático. Me sinto morto cada dia que passa enquanto aqueles miseráveis do meu trabalho sugam toda a minha vida e transformam em dinheiro.
Por volta das cinco da manhã eu consigo dormir e seis e meia eu acordo para mais um dia de trabalho. Se é que eu posso chamar aquilo de trabalho. Aquilo é uma chacina intelectual. Se as barbaridades estupidas que eu escuto e vejo todos os dias fossem sangue, acho que eu estaria naquela cena do filme do Kubrick onde vem uma onda de sangue e enche um corredor inteiro. Eu não acredito que ainda não tomei nenhuma atitude. Gostaria de ser alguém diferente nesse ponto.
Quando abro a porta de casa eu esbarro com o carteiro e ele me entrega a encomenda que eu estou esperando cerca de três meses. Volto para dentro de casa eufórico e abro a caixa como uma criança abre seu presente de natal na manhã do dia vinte e cinco. Ela é linda. Preta, com um cartucho cheio. Pesa cerca de quatrocentos grama e é perfeita.
Minhas mãos começam a tremer mais ainda, vejo meu coração batendo pela minha camisa e minha respiração está pesada demais. Tomo todas as pílulas que encontro e caio na cama sem saber o que eu fiz.
Acordo duas horas depois com o telefone tocando. É o gordo me ligando perguntando onde eu estou. Nesse momento eu já não sou eu mesmo. Eu não respondo nada, apenas desligo meu telefone, visto uma gravata e boto a minha arma na cintura.
Ao chegar no escritório me tranco com o meu chefe na sala dele e o torturo até ele morrer de hemorragia, logo depois vou até a sala da minha supervisora e faço ela ir para a sala do boçal do quinto andar e mostrar pra ele um exame de sangue dela que diz que ela é soro positivo e logo depois disso dou um tiro na cabeça dela.
E essa é a minha história. Eu não quero saber o que o juri vai achar, meritíssimo. Eu estou cagando para esses idiotas desocupados que estão aqui ouvindo essa ladainha para ganhar dez reais. Eu estou em paz, eu consigo dormir todas as noites e acordar com um sorriso no rosto. Eles me mataram por oito anos. Eu só os matei um dia. Acho justo.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Um casal por acaso - Parte 1

Era uma tarde qualquer na cidade onde Julia morava. Ela estava seguindo em direção à sua casa vindo da casa de uma amiga. Geralmente ela vinha pela rua principal, mas hoje ela veio por uma rua secundária para não ter que pegar uma ladeira, pois hoje ela estava de skate.
Ela não tinha se dado conta de que o caminho era razoavelmente mais longo e acabou por ficar com sede e um tanto cansada. Sabia que ainda faltavam dois quarteirões quando calculou onde devia estar e preferiu fazer uma pausa para recuperar o seu fôlego.
Na esquina do quarteirão ela viu um café e decidiu ir até lá para tomar um refrigerante e descansar por alguns minutos. Ao chegar no café, ela viu que o único lugar vago era a última mesa do lado da janela. Ela percorreu o café todo e no trajeto bateu com o skate em uma das mesas sem querer e pediu desculpas sem nem olhar para a pessoa, pois ela ficou sem jeito. Chegou até a mesa, sentou-se e fez o pedido.
Quando a garçonete trouxe o seu refrigerante ela olhou para a mesa em que seu skate havia batido e viu que era um rapaz sentado nela. Moreno, mais ou menos 25 anos, cabelos ondulados, costeletas, magro, com tatuagem no braço esquerdo e metade do peitoral e usando uma camisa regata. Ele lia um livro de astronomia e em cima da mesa havia um chapéu coco e ao lado dele uma mochila.
Logo Julia tratou de pegar seu celular para ver se alguma de suas amigas estava online para contar essa fofoca. Acessou a internet e foi falar com Anna e contar a novidade. A conversa seguiu mais ou menos assim:

Julia diz: Aninha! Você não vai acreditar no que aconteceu!

Anna diz: O que foi, amiga?

Julia diz: Eu peguei aquele caminho mais longo para casa e fiquei cansada por causa do skate e resolvi parar para tomar um refrigerante e quando eu estava vindo até a mesa onde estou eu bati o skate na mesa de um cara lindo.

Anna diz: Nossa! E ele ficou irritado?

Julia diz: Não. Nem notou a minha existência. Além disso eu estou toda descabelada, quase sem maquiagem porque eu suei andando de skate e usando uma roupa péssima!

Anna diz: Quanto à roupa eu tenho que concordar com você. Tênis de skate, blusa larga e meia até a canela é muito coisa de menino.

Julia diz: Poxa, Anninha. Brigadão pelo conforto nessa hora de crise.

Anna diz: Hahahaha. Desculpa, amiga, mas é verdade. Mas olha só... talvez ele tenha mais coisa na cabeça do que parece. Ele pode estar pensando em outras coisas e nem ter notado ninguém mesmo.

Julia diz: É verdade... Ele parece estar lendo um livro de astronomia também. Tinham planetas na capa.

Quando Julia acaba de mandar essa mensagem dividindo olhares entre seu celular e o rapaz, ela vê que ele guarda o livro na mochila, levanta-se, põe o chapéu, põe dois fones, um em cada ouvido, e vai embora. Ele passa por ela do outro lado da janela e ela olha para ele discretamente e cobre o rosto fingindo arrumar o cabelo para que ele não reparasse que ela estava olhando para ele.
Depois desse dia ela faz esse trajeto mais longo e para no café para descansar sempre que volta da casa de Anna. Ela espera encontrar com ele alguma outra vez.

domingo, 5 de junho de 2011

Questão de vetores?

"Você é tudo que eu quero."
É só uma simples frase.
Depois de tudo que passamos o que você tem...
É não ter nada pra dizer.
Não acredito nisso.
E tudo que era de um jeito você transformou em outra coisa.
Nada mais vale agora.
O fim que eu nunca consegui ver...
Se baseia numa frase.
"Tudo que você não percebeu."

Foi assim quando eu disse que você era tudo pra mim. Eu disse de baixo pra cima. Você leu de cima pra baixo. Depois disso eu comecei a escrever coisas do jeito que você lê. Comecei com "sinto a sua falta". Pena que era tarde.